Dramaturgias de Ator

A linha de pesquisa Dramaturgias de Ator se configura em espaços teórico-práticos de investigação atorial em perspectiva mais autoral por parte dos atores/pesquisadores (incluindo projetos de Iniciação Científica). Envolve alunos, professores e pesquisadores em processos cênicos experimentais e no exercício da autonomia composicional do atuante. Os espetáculos Traços ou Quando os Alicerces Vergam (solo de Alice Stefânia com direção de André Amaro), Duplos (direção de Alice Stefânia e Fernando Santana, com assistência de direção de Rachel Mendes), MalvaRosa (direção de Alice Stefânia - http://malvarosaagreste.blogspot.com/), e Mundaréu (parceria com a Cia. Dois Tempos, com direção Alice Stefânia - http://www.ciadoistempos.blogspot.com.br/p/mundareu.html) bem como a série de vídeos Fui deixando meus corpos pelo caminho (coordenação de Alice Stefânia) estão ligados a essa linha.

Coordenação: Alice Stefânia
 


PRODUÇÕES ARTÍSTICAS


Mundaréu


Em 2013, conheci a Cia. Dois Tempos, um coletivo de jovens atores (dentre os quais alguns estão cursando Interpretação Teatral na UnB), com seus corpos, ideias e desejos fervilhando. Eles me procuraram manifestando o interesse em vivenciar um processo provocado por práticas e poéticas atoriais como as que venho experimentando no Departamento de Artes Cênicas da UnB, em contextos de ensino e junto ao Grupo de Pesquisa Poéticas do Corpo.


Encantei-me com o desafio. Ainda não havia mergulhado artisticamente no universo de Plínio 
Marcos e percebi, na proposta de adaptação do grupo, princípios dramatúrgicos bem contornados, uma pesquisa prévia sobre o universo a ser trabalhado, um discurso consistente e disposição para buscar suporte material para a concretização do trabalho.

Assim nasceu nosso “Mundaréu”, resultado da adaptação de duas obras de Plínio Marcos, “Abajur Lilás”, escrita em 1969 e o romance “Querô, Uma Reportagem Maldita”, escrito em 1976 e adaptado para o palco três anos depois. As obras originárias se desenvolvem num crescente de violência, relações de poder, humilhação e vingança, em que não se consideram meios e consequências. As personagens são marcadas por desamor, desilusão, compulsão e pela luta por sobrevivência. Os diálogos, em tons crus e sombrios, desfiam histórias de vida de figuras marginalizadas e invisibilizadas socialmente.



Para adentrar no denso universo dessas figuras plinianas, trabalhei com o coletivo um processo de experimentação com matrizes corporais que os deslocassem de uma interpretação realista, e os levassem a um registro excessivo e disforme. A busca desse tom grotesco na atuação se deu especialmente por dois fatores. Primeiro pelo fato de o grupo ser composto por atores muito jovens e distantes da realidade social tratada na obra de Plínio. Como corpos tão saudáveis, belos, “limpos” e sem qualquer lastro de uma vida rude poderiam dar conta do peso e da aspereza desse universo? O estímulo à exacerbação do corpo e dos sentimentos apoiou a construção dos atores.


Por outro lado, o grotesco, em suas qualidades de desmesura, estranheza, distorção e aviltamento, dialoga bem com o cáustico universo do autor, repleto de emoções pungentes e vidas dilaceradas. Assim, nossa montagem sustentou o tom rascante de Plínio, que escancara a face dolorosa de um mundaréu sem ilusões, onde todos parecem reféns de um determinismo social intransponível.


Em nossa montagem a narrativa se constrói em distintos planos temporais e espaciais, que se atravessam e se redimensionam no jogo cênico. Três estruturas metálicas se desdobram de forma e sentido ao longo da trama. Ora são grades, ora camas, por vezes em composição estática, por vezes em movimento, mas sempre frias e áridas, em contraste com o corpo que arde em raiva, dor, medo, febre, fome.



Uma obra cênica é sempre um tecido coletivo, tramado e bordado a muitas mãos e afetos. Davi, Helena, Jordana, Miguel e Thiago, os cinco atores, apesar da pouca idade e experiência, demonstraram vontade, entrega e responsabilidade no trabalho. A base dramatúrgica proposta inicialmente por Ribondi, mexida e remexida por todos a partir das exigências do próprio fazer em processo, foi um ponto de partida fundamental. A presença parceira e o olhar atento de Fernando Santana proporcionou uma interlocução crítica e sensível durante todo o percurso. A escuta e disponibilidade de Guto Viscardi soube imprimir materialidade poética e funcional aos nossos desejos e necessidades de cenografia e figurino. Às equipes de música, luz, fotografia, cenotecnia e produção, enfim, a todos meu carinho e gratidão pelo criar compartilhado! Juntos, propusemos, compusemos, questionamos, criticamos, fomos criticados, comemoramos, nos frustramos, entramos em crise, construímos, duvidamos, adoecemos, nos benzemos, reconstruímos, enfim, imergimos no processo e demos vida à uma obra.


O espetáculo estreou em maio de 2014 na Sala Adolfo Celli, em Brasília, seguiu para apresentações em Taguatinga e Ceilândia. Mundaréu foi selecionado para integrar a programação da 15º edição do festival Internacional Cena Contemporânea, com apresentações no CCBB e foi convidado para integrar a ocupação da Funarte Brasília, pelo Brecha Coletivo, realizando três apresentações na Sala Plínio Marcos.


Seguem links onde se podem ler matérias, críticas e comentários espontâneos sobre o trabalho:

http://teatrojornal.com.br/2014/08/nos-dobras-de-plinio-marcos/http://vejabrasilia.abril.com.br/blogs/eixo-cultural/teatro/cena-contemporanea-traz-um-plinio-marcos-a-brasiliensehttp://www.oportunaidade.com/interna/Correspondente/mundareu-a-tragedia-grega-contemporanea-http://noelbsb.blogspot.com.br/2014/08/mundareu-cena-contemporanea-2014.htmlhttp://www.cenacontemporanea.com.br/programacao/mundareu-dois-tempos-cia-de-teatro-df/

Ficha Técnica:

Textos originais: Plínio MarcosAdaptação: Alexandre Ribondi e grupoDireção: Alice StefâniaCodireção: Fernando SantanaElenco: Davi Maia, Helena Miranda, Jordana Mascarenhas, Miguel Peixoto e Thiago RamosDireção Musical: Miguel PeixotoMúsicos: Isabela Pina, Matheus MikuymDesenho de Luz: Abaetê QueirozCenário e figurino: Guto ViscardiFotografia: Fernando Santana, Nathalia Azoubel, Thiago BarretoCoordenação de produção: Jordana MascarenhasProdução executiva: Desvio Produções Culturais


Gota


No segundo semestre de 2012, quando ministrei a disciplina Interpretação e Montagem, sugeri à turma de estudantes do departamento de Artes Cênicas da UnB trabalharmos com a obra Gota d’Água, de Chico Buarque e Paulo Pontes. Após leitura, a turma aceitou o desfio.



O processo, colaborativo, foi realizado em duas etapas em que me apoiei em estudos ligados à linha de pesquisa Dramaturgias de Ator. A primeira etapa, voltada à pesquisa, teve intensa contribuição dos estudantes, os quais realizaram estudos, seminários, oficinas, provocações, etc. Esta etapa se desdobrou em:


  1. Investigação das dimensões críticas, políticas, analíticas e históricas do texto, do contexto em que este foi escrito, do mito de Medeia, da musicalidade da obra, de visualidades e transversalidades associadas ao tema, culminando com o processo de análise dramatúrgica e adaptação do texto. Em virtude do exíguo tempo de trabalho, ‘enxugamos’ mais da metade da obra, atentos a manter em equilíbrio as abordagens política e afetiva pelas quais o texto se desenrola.
  2. A segunda etapa de pesquisa voltou-se a experiências expressivas e composicionais provocadas pelos estudantes e por mim em torno dos seguintes princípios e fontes: (1) composições a partir da poética de coralidade; (2) práticas corpóreo~vibráteis como meios para despertar e exercitar qualidades de movimento, escuta, estado e presença cênica; e (3) exercícios de exploração de sonoridades na/da cena a partir de canções, voz, corpo, instrumentos e objetos; (4) os Orixás do Candomblé e suas características, danças, corporeidades, visualidades e musicalidades. Em relação a essa fonte tivemos consultoria do Pai Jorge, Pai de Santo, e trabalhamos com princípios da dramaturgia de movimentos dos Orixás, aprendidos pela estudante Luciana Matias em oficina com Augusto Omolú. Nesta etapa houve definição e coleta de materiais e perspectivas expressivas que orientariam nossa criação, em consonância com os aspectos observados na análise do texto e estudo do contexto, delineando nossa concepção para a encenação.

A etapa seguinte consistiu na montagem propriamente do espetáculo. Neste momento trabalhamos com o levantamento de cenas a partir dos princípios poéticos já eleitos e explorados anteriormente. Foram realizados, por núcleos, ensaios e proposições criativas de cenas, que posteriormente eram apresentadas a mim e à turma e lapidadas. O fato de termos construído e eleito coletivamente as bases de nossa criação, de nossa concepção, proporcionou uma poética comum por parte das cenas trabalhadas paralelamente por núcleos. Ao mesmo tempo, iam-se dando as produções nas diversas áreas da encenação, figurino, cenografia, música, iluminação e os ajustes dramatúrgicos.

Visando equacionar o número de personagens e o de estudantes matriculados na disciplina sugeri ‘coralizarmos’ a personagem Joana, protagonista da obra. Ao invés de optar pelo puro coringamento, nos apoiamos na força do coro. O mito poetizado em "Medeia", de Eurípedes é, como se sabe, fonte para composição da Joana de Chico Buarque e Paulo Pontes. Assim, a coralidade foi pra nós uma referência importante, já que está ligada à poética das tragédias gregas. Além disso, o coro mostrou-se um recurso expressivo e composicional bastante potente, com grande ressonância no processo criativo e pedagógico.




Além de coralizar Medeia - multiplicando-a em uma miríade de estados e facetas – criamos um coro/séquito de Creonte, o qual era feito pelos próprios personagens moradores da Vila do Meio-dia. As imagens criadas pelos dois coros explicitavam tensões afetivas e políticas, vulnerabilidades emocionais e sociais, misérias éticas e econômicas, corruptibilidade e jogos de poder. As interações entre os coros visavam intensificar os impasses e contrastes entre Joana (protagonista) e Creonte (antagonista). Além disso, Medeia, a feiticeira, e seu povo invisível, seus santos, deuses, entidades e "Orixás do Olimpo" tiveram uma possível tradução na imagem do coro de Joanas. Por fim, houve a preocupação pedagógica de que talvez fosse um desafio demasiado grande para uma jovem atriz de vinte e poucos anos sustentar sozinha uma personagem com a espessura e complexidade de Joana.

Outro aspecto a ser destacado na obra de referência que ganhou contornos em nossa montagem acadêmica foi a musicalidade. Alguns estudantes/atores já tinham experiência com música e colaboraram na concepção sonora da obra. A maior parte do tempo, a banda ocupava uma mesa no espaço ficcional do Bar do Galego.

Ao lado de algumas canções da obra original, elegemos outras músicas de Chico Buarque e de outros compositores para compor a peça. A canção “Jornal da Morte”, de Roberto Silva, abria o espetáculo, com todos os atores em cena cantando em coro “Sangue, sangue, sangue”. A música de umbanda “O sino da igrejinha” entrou cantada pelo coro de Joanas na cena em que invocam os “Orixás do Olimpo”, acompanhada por palmas e atabaque. Trechos de “Deus lhe pague” de Chico Buarque também integrou a montagem, sendo cantada por Creonte e pelo coro compondo com imagens onde Creonte corrompe a comunidade da vila.



A musicalidade da cena foi também bastante explorada não só com as canções, mas com sonoridades e ritmos produzidos pelas ações dos personagens em cena com jornais, vassouras, tampinhas, garrafas, etc.

Além de cinco apresentações durante o Cometa Cenas - Mostra Semestral de Curso do Departamento de artes Cênicas da UnB, o espetáculo foi convidado a ocupar o Teatro da Caixa Cultural em Brasília, onde realizou gratuitamente três sessões.


Matéria sobre o trabalho pode ser conferida em:

http://www.paralelomundi.com.br/relembre-gota-em-bsb/

Ficha Técnica:
Texto Original: Chico Buarque e Paulo Pontes
Adaptação: o grupo
Direção: Alice Stefânia
Elenco: Ana Luisa Quintas, Ana Paula Monteiro, Anahi Nogueira, Bruno Lexh, Clarice César, Clarisse Johansson, Douglas Menezes, Edu Moraes, Flávio Café, Giselle Ando, João Lima, Julia Rizzo, Kael Studart, Lorena Pires, Luciana Matias, Malena Bonfim, Paco Leal, Pricila Leite, Raquel Ferreira, Rodrigo Issa, Tainá Baldez, Túlio Starling e Yohana Torres
Direção Musical: Edu Moraes
Músicos: Edu Moraes, Iuri Gules, Isabella Pina e Rodrigo Issa
Cenografia e Luz: Ingrid Mariz, Kayla Maihery, Luisa Drupat, Tamara Correia, Guto Viscardi e Marcelo Augusto.
Fotografia: Fernando Santana e Adla Marques



MalvaRosa 




O espetáculo foi criado no segundo semestre de 2010, no contexto da disciplina Interpretação e Montagem, na UnB se desdobrando posteriormente para além da disciplina. A professora Alice Stefânia apresentou o trabalho de Newton Moreno, autor, diretor e ator, e a turma optou por encenar Agreste, ou MalvaRosa. Em meio à aridez sertaneja, dois corações florescem divididos por uma cerca. Amor, ignorância, preconceito e fé são alguns dos afetos que movem esta trama de Newton Moreno. MalvaRosa – texto premiado, também conhecido como Agreste – é um poema trágico bem brasileiro que flui por gêneros como o drama, a comédia e o épico. Dor e alegria, fé e desconsolo, choro e riso se tensionam na história, num jogo de contrastes e ambivalências que potencializam o impacto da peça.



O espetáculo MalvaRosa é fruto de um processo colaborativo de oito atores, aos quais posteriormente se somaram quatro músicos, sob a direção de Fábio Miranda. Os atores se revezam entre papéis e criam diferentes disposições ao longo da cena, por meio da organização diferenciada de seus elementos cênicos. Caixotes, redes e velas são manuseados e ressignificados através de dramaturgias atoriais. A banda com sanfona, viola, violino, flauta, percussão e voz, acentua os tons ora narrativos, ora dramáticos, ora cômicos. Dentre várias participações em eventos, mostras e festivais, destaca-se o FITUB. O espetáculo ganhou um prêmio (concepção sonora) e quatro indicações (melhor espetáculo, direção, cenário e iluminação) na edição 25 do Festival Internacional de Teatro Universitário de Blumenau, em julho de 2012. Na ocasião conquistou também importantes críticas, disponíveis em: http://saraunofitub.blogspot.com.br/2012/07/malva-rosa-e-planta-femea-e-segredo.html http://divora.com.br/literatura-homoafetiva.html
http://wp.clicrbs.com.br/contracapa/2012/07/05/fitub-comeca-com-publico-encantado-com-espetaculo-de-abertura/



Segue apresentação sucinta de princípios artísticos e pedagógicos norteadores da construção do espetáculo:
  1. Construção colaborativa: embora com papéis claramente definidos (direção, atuação, iluminação, cenografia, etc) todos os agentes do processo foram convidados e provocados a contribuir artística e conceitualmente na composição da obra. 
  2. O estudo do texto se voltou para um mapeamento de sentidos emergentes da obra dramatúrgica, dos semânticos e mais evidentes, aos mais afetivos, metafóricos, simbólicos, políticos, etc. 
  3. Proposição de imersões criativas no universo do texto, por parte dos alunos e da professora com coleta de material expressivo (a partir de sabores, imagens, texturas, objetos, etc.). 
  4. Levantamento de matrizes de trabalho gestual inspiradas em questões de gênero, no imaginário nordestino ligado à morte, à seca, etc., e a partir de outros sentidos e afecções provocados pelo texto e imagens a este associadas. 
  5. A ideia de ator-rapsodo, desenvolvida pela atriz, pesquisadora e professora da Unirio Nara Keiserman, que pensa o lugar do trabalho atorial no trânsito entre a narrativa e a atuação, com forte influência de Brecht com o teatro Épico e do teatro gestual. 
  6. Apropriação, por parte dos alunos do texto na íntegra, para somente após improvisações definir-se as falas de cada um. 
  7. Coringamento contínuo de personagens/narradores. 
  8. Improvisos a partir da técnica de view points (sistematizada por Anne Bogart e Tina Landau, visa desenvolver repertório corpóreo-vocal para improvisação no espaço-tempo, promovendo reconhecimento e apropriação destes elementos expressivos) com a inserção de tarefas pensadas para ambiências e momentos específicos do texto, e uma gradual e orgânica fixação de marcas cênicas. 
Ficha Técnica
Texto: Newton Moreno
Direção: Alice Stefânia
Atuação: Bernardo Côrtes, Caio Lins, Cleide Mendes, Diego Borges, Eros
Bittencourt, Michelli Santini, Ramayana Régis e Rita Cruz.
Direção musical: Fábio Miranda
Músicos: Fábio Miranda, Káshi Mello, Maria Schramm e Naira Carneiro
Operação de luz: João Vitor Morgado
Fotos: Fernando Santana


Traços ou Quando os alicerces vergam




O espetáculo Traços ou Quando os alicerces vergam mostra um dia na vida de uma mulher solitária cujo cotidiano nunca se restringe a sua presumível normalidade, ganhando contornos ora patéticos, ora fantásticos, ora trágicos, ora absurdos. Confinada em seu apartamento no alto de um prédio, uma mulher solitária gera, compulsivamente, um mundo imaginado. A montagem, inspirada na obra de Ana Miranda, precisamente nos livros Noturnos (contos, 1999) e Clarice (novela, 1996), ganhou uma encenação minimalista, poética, cheia de sutilezas, apoiada em poucas palavras e muitas ações físicas.



Ganhador do prêmio Myrian Muniz de fomento ao teatro, o espetáculo, é resultante da parceria entre a pesquisa de doutorado da atriz Alice Stefânia – matrizes taoístas em trânsito com construções expressivas, e a pesquisa do diretor André Amaro - pautada na metáfora do caleidoscópio para o corpo em cena. Nessa primeira montagem juntos, os artistas descobriram vários pontos em comum. Ambas as pesquisas almejavam construir uma dramaturgia atorial geradora de polissemia cênica, ou seja, operadora de possibilidades mais ativas e criativas de leituras, no processo de recepção.



Desde sua estreia em 2006 conquistou oito prêmios, duas indicações, além de participação em festivais e mostras nacionais e internacionais (Cena Contemporânea, Prêmio Sesc e Palco Giratório - Brasília, Sala do Coro do Teatro Castro Alves - Salvador, Festival de Monólogos - Teresina, II Encuentro de Teatro Contemporâneo e Tercer Festival UCSUR de Teatro Internacional - Lima/Perú). A peça, apontada como uma das melhores de 2006 em Brasília em retrospectiva de teatro do Correio Braziliense (27 de dezembro de 2006, capa do caderno de Cultura), obteve ainda a seguinte crítica:


JORRO DE CRIATIVIDADE
Alice Stefânia emociona e surpreende em belo espetáculo.
A concepção do teatro como caleidoscópio inunda o palco no espetáculo Traços ou Quando os Alicerces Vergam. Com Alice Stefânia, alguns objetos de cena e o músico Lupa na sonoplastia, André Amaro monta uma das peças mais criativas da temporada 2006 em Brasília. A cada seqüência, esses elementos constroem inusitadas possibilidades de interpretação para a platéia. O mote parte da obra Noturnos, de Ana Miranda. Mulher solitária que vive entre o limiar de ações físicas do cotidiano e do delírio. Trabalha com lembranças que são recriadas de forma inesperada, a partir de dramaturgia de movimentos. Numa das mais belas seqüências, Alice Stefânia contracena com uma camisa masculina, valsa com a peça e recompõe os carinhos do amante. Em outra, banha-se em bacia, em sincronia com os sons criados ao vivo por Lupa. O texto de Ana Miranda pontua o espetáculo, sendo parte de dramaturgia criada no somatório dos elementos. Quando surge, é imperativo pela fluidez e beleza com que é interpretado por Alice Stefânia. A atriz brinca com o corpo numa leveza que reflete seus estudos acadêmicos (ela faz doutorado na Bahia, onde pesquisa relação entre movimentos opostos, como yin/yang, quente/frio, seco/úmido). Com a ajuda de elásticos (aqueles com que as meninas brincam na infância), traça mosaicos curiosos e emocionantes dentro de cenário inteligente, que se molda à proposta. Realçado numa iluminação narrativa e precisa de André Amaro, o espetáculo reapresenta a Brasília Alice Stefânia, atriz de infinitas possibilidades, que ao final canta lindamente Poeira Leve, de Tom Zé. (Sérgio Maggio, crítico de teatro do Correio Braziliense, 28 de outubro de 2006, capa do caderno de Cultura)

Ficha Técnica
Inspirado em contos de Ana Miranda
Concepção e transcriação: Alice Stefânia e André Amaro
Direção: André Amaro (Teatro Caleidoscópio).
Atuação e produção: Alice Stefânia.
Música: Luciano Marques (Lupa)
Cenografia, objetos e figurino: Maria Luiza Fragoso (Malu)
Iluminação: André Amaro


Duplos 
O espetáculo teatral Duplos se baseou em dois contos do jornalista e escritor de Brasília, José Rezende Jr., interpretado e dirigido por Alice Stefânia e Fernando Santana. Uma das idéias chaves desta proposta foi a de pensar as tensões entre os lugares de diretor(a) e ator(atriz) no contexto atual do teatro: atores reivindicando um papel artístico propositivo, recusando a mera execução de marcas, e diretores apostando em metodologias colaborativas para suas obras. Essa reflexão gerou a experiência deste projeto: um jogo onde um diretorator e uma diretoratriz se provocaram e dirigiram mutuamente.



A encenação inicialmente proposta teria dois atos, sendo um monólogo por ato. Entretanto, no curso do processo, o trabalho foi redimensionado, passando a configurar duas histórias simultâneas. A partir desse ponto do processo a artista cênica Rachel Mendes foi convidada a atuar como assistente de direção do trabalho. Sua função, uma vez que a concepção do espetáculo já havia sido esboçada, foi a de acompanhar a fusão auxiliando nas identificações de contrastes e ressonâncias e na lapidação das cenas. As intertensões surgidas na simultaneidade das cenas potencializaram e multiplicaram sentidos da cena.




De um lado do palco Alice Stefânia criou a Monga, do conto A mulher gorila, que se baseia no famoso quadro circense onde uma mulher se transforma em fera através de um truque de espelhos. Utilizando a metáfora desta performance, a história mostra o conflito interno entre uma mulher, artista de circo, e sua personagem a Gorila, com quem ela se identifica intensamente. O conto problematiza padrões de beleza, sensualidade e bestialidade. De outro lado, Fernando Santana compôs, a partir do conto Ainda é tarde, o quadro neurótico de um homem vivendo uma reclusão autoimposta em seu próprio apartamento – uma camisa de força simbólica - enfrentando fantasmas reais e imaginários. Suas ações e reações lembram síndromes familiares ao mundo contemporâneo, e o mostram mergulhado em contradições, conflitos e ambivalências.

A noção do duplo artaudiano e do grotesco em Meyerhold, serviram de inspiração conceitual para a concepção do espetáculo, que articula ambiguidades, paradoxos e polarizações. Em O teatro e seu duplo, Artaud apresenta a crueldade, a peste, a metafísica, entre outras imagens, como possíveis fornecedoras de novos sentidos para cena teatral. Meyerhold, por sua vez, explora a ideia do grotesco, a qual refere-se tanto à exacerbação e distorção do real, quanto a uma estética construída sobre contrastes - entre registros trágicos e cômicos, populares e eruditos, contemporâneos e ancestrais.

Ficha Técnica
Textos: José Rezende Jr.
Concepção, transcriação, direção e atuação: Alice Stefânia e Fernando Santana
Assistência de direção: Rachel Mendes
Cenografia e vídeos: Bia Medeiros, Camila Soato e Fernando Aquino
Figurino e maquiagem: Cyntia Carla
Música: Jorge Brasil
Iluminação: Marcelo Santana
Produção: Neide Nobre

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